Oitava alteração do Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro

Sua Excelência

O Juiz Conselheiro Presidente do

Tribunal Constitucional

            O Representante da República para a Região Autónoma da Madeira vem, ao abrigo do disposto no artigo 278.º, n.ºs 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa, requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação preventiva da constitucionalidade das normas adiante especificadas, constantes dodecreto que lhe foi enviado para assinatura como decreto legislativo regional intitulado “Oitava alteração do Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, que estabelece a estrutura orgânica da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira”, aprovado em sessão plenária no dia 23de fevereiro p.p. e recebido, no seu Gabinete, no dia 7 de março p.p., nos termos e com os fundamentos seguintes:

I

As Normas Objeto do Pedido

        1.O Decreto enviado para assinatura do Representante da República como Decreto Legislativo Regional (doravante, simplesmente “Decreto”) pretende constituir a oitava alteração ao Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, que estabelece a estrutura orgânica da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira.[1]

           2.O artigo 1.º do Decreto introduz modificações em diversas normas do Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, e o artigo 2.º pretende aditar novos artigos.

          3.Constituem objeto do presente pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade normas novas, incluídas no artigo 2.º, bem como os artigos 5.º e 8.º, n.º 3 do Decreto em apreço.

 

A)   O artigo 8.º, n.º 3 do Decreto em apreço:

       4.No preâmbulo do decreto sob sindicância assinala-se que a aprovação deste visou reforçar o compromisso, assumido com a população, em 2015, de “perante um novo cenário partidário e político” reduzir “em 40 por cento” as “subvenções mensais atribuídas aos deputados únicos e grupos parlamentares.” Consequentemente, a Assembleia Legislativa alterou o disposto nos artigos 46.º e 47.º do Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro. Os artigos 46.º e 47.º, alterados pelo artigo 1º do Decreto em apreço passam a ter a seguinte redação:

 

Artigo 46.º

Subvenção à Atividade Parlamentar

1 – Os grupos parlamentares e deputado único representante de um partido dispõem, para encargos de assessoria aos deputados, para a utilização de gabinetes constituídos por pessoal da sua livre escolha, nomeação, exoneração e qualificação, para atividade política e partidária em que participem e para outras despesas de funcionamento, de uma subvenção anual.

2 – A subvenção anual, definida nos termos do n.º 1, corresponde a 2x14x RMMG-2015 (Retribuição Mínima Mensal Garantida, para vigorar na RAM em 2015) /mês, por deputado.

3 – [anterior n.º 2].

4 – O pessoal nomeado nos termos do n.º 1 não pode auferir remuneração mensal ilíquida superior à de deputado em exercício de funções.

5 – [anterior n.º 10].

6 – É aplicável aos membros dos gabinetes referidos no presente artigo o disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 11.º do presente diploma.

7 – Os membros dos gabinetes previstos no presente artigo são portadores de um cartão de identificação conforme anexo IV do presente diploma.

 

Artigo 47.º

[…]

1 – A cada partido que haja concorrido a eleição para a Assembleia Legislativa da Madeira, ainda que em coligação, e que nela obtenha representação é concedida uma subvenção anual, desde que requerida ao Presidente da Assembleia, que consiste numa quantia em dinheiro, fixada nos termos dos números seguintes, adequada às suas necessidades de organização e funcionamento.

2 – A subvenção referida no n.º 1 é paga em duodécimos e transferida diretamente para os partidos, por conta de dotações especiais para esse efeito inscritas no orçamento da Assembleia Legislativa, nos seguintes termos:

       - Representação de um só deputado e grupos parlamentares – 7x14x RMMG-2015 (Retribuição Mínima Mensal Garantida, para vigorar na RAM em 2015) /mês, por deputado.

3 – Ao montante referido no número anterior, acresce a ponderação de 1xRMMG-2015/mês, por deputado.

4 – Nos casos de coligação eleitoral a subvenção devida a cada um dos partidos nela integrados é igual à subvenção que, nos termos dos números anteriores, corresponder à respetiva coligação eleitoral, distribuída proporcionalmente em função dos deputados eleitos por cada partido, salvo disposição expressa em sentido distinto constante de acordo da coligação.

      5.Requer-se, assim, a apreciação da norma contida no artigo 8.º, n.º 3 do Decreto em apreço, a qual determina o seguinte:

“O disposto no n.º 1 do artigo 46.º e no n.º 1 do artigo 47.º da Estrutura Orgânica da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, na redação dada pelo presente decreto legislativo regional, tem natureza interpretativa e aplica-se aos exercícios económicos anteriores.”

 

B)   A introdução de um novo artigo 48.º-A ao Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro:

     6Por outro lado, o artigo 2.º do Decreto em apreço adita o artigo “48.º-A” ao Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, sob a epígrafe “Antigos Deputados” questionando-se, no presente pedido, a constitucionalidade deste artigo. Dispõe tal norma como se segue:

 

“Artigo 48.º-A

Antigos Deputados

1 – Os antigos Deputados que tenham exercido mandato de Deputado na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, durante pelo menos quatro anos, têm direito a um cartão de identificação próprio, conforme anexo V do presente diploma.

2 – Os antigos Deputados a que se refere o número anterior, têm, além de outros direitos e regalias que venham a ser fixados por despacho do Presidente da Assembleia, direito a livre trânsito no edifício da Assembleia Legislativa durante o período normal de funcionamento, o qual compreende a circulação e permanência nas instalações comuns e o direito de assistir às reuniões plenárias na galeria reservada aos convidados.

3 – As associações constituídas por antigos deputados que reflitam pluralidade partidária e democrática, desde que reconhecidas por maioria de dois terços do Plenário da ALM como revestidas de interesse parlamentar, podem beneficiar de apoio logístico e financeiro à sua atividade.

4 – O apoio previsto no número anterior é concedido por despacho do Presidente da Assembleia, mediante requerimento dos interessados e sob proposta do Conselho de Administração, ouvido o Conselho Consultivo.

5 – Perde o estatuto de Antigo Deputado, quem:

a)     Não respeitar a dignidade da Assembleia Legislativa e de todos os que nela têm assento e não acatar a autoridade do Presidente da Assembleia.

b)     Com a sua conduta desprestigiar os trabalhos da Assembleia Legislativa.

6 – A perda do estatuto de Antigo Deputado, nas circunstâncias referidas no número anterior, é declarada pelo Presidente da Assembleia Legislativa.”

           7. Conjuntamente, importa também questionar a constitucionalidade do disposto no artigo 5.º do Decreto em apreço, que, sob a epígrafe “Associações de interesse parlamentar”, estabelece que “Para efeitos do regime previsto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 48.º-A é reconhecido à “Aedal-Ram – Associação dos Ex-Deputados da Alram” o estatuto de associação e interesse parlamentar.”

II

Da inconstitucionalidade da norma contida no artigo 8.º, n.º 3 do Decreto em apreço

            8.Uma leitura atenta do Decreto em análise permite concluir que este visou, primacialmente, modificar as subvenções mensais atribuídas pela Assembleia Legislativa.

             9A comparação entre a proposta em apreço e as alterações que tinham sido introduzidas pelo Decreto Legislativo Regional n.º 2/2015/M, de 26 de janeiro – em particular no que respeita ao disposto nos artigos 46.º e 47.º - permite concluir que o montante total que resulta do cálculo das fórmulas (ou, dito de outra forma, da adição dos valores) previstos no artigo 46.º e no artigo 47.º é rigorosamente igual quando comparadas a redação anterior e a redação agora proposta para os dois artigos.

          10. Por outras palavras, verifica-se que o legislador pretendeu, prima facie, na proposta em apreço, redistribuir o total das verbas que resultavam, anteriormente, do disposto nos artigos 46.º e 47.º determinando, consequentemente, que essa distribuição passe a ser feita de acordo com a seguinte ponderação:

 Artigo 46.º - 2x14x RMMG-2015 (Retribuição Mínima Mensal Garantida, para vigorar na RAM em 2015) /mês, por deputado.

 Artigo 47.º - 7x14x RMMG-2015 (Retribuição Mínima Mensal Garantida, para vigorar na RAM em 2015) /mês, por deputado mais 1xRMMG-2015/mês, por deputado.

          11. Na redação anterior, a fórmula aplicável em cada um dos artigos era a seguinte:

Artigo 46.º - 9X14SMNR (Salário Mínimo Nacional em vigor na Madeira)/mês/número de deputados.

Artigo 47.º - dois quintos do salário mínimo nacional em vigor na Madeira por deputado eleito, mais a ponderação dos seguintes fatores:

a) Representação de um só deputado e grupo parlamentar - três quintos do SMNR (salário mínimo nacional em vigor na Madeira) X o número de deputados.

        12. Procurou-se, dessa forma, concretizar aquilo que resulta do disposto no artigo 5.º, n.º 8 da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais[2], na redação que resulta da Lei n.º 4/2017 de 16 de janeiro, que dispõe da seguinte forma:

 

8 - A cada partido que haja concorrido a ato eleitoral, ainda que em coligação, e que obtenha representação na Assembleia Legislativa da região autónoma é concedida uma subvenção anual, desde que a requeira ao Presidente dessa Assembleia Legislativa, que consiste numa quantia em dinheiro fixada no diploma que estabelece a orgânica dos serviços da respetiva Assembleia Legislativa, adequada às suas necessidades de organização e de funcionamento, sendo paga em duodécimos, por conta de dotações especiais para esse efeito inscritas no Orçamento da respetiva Assembleia Legislativa, aplicando-se, em caso de coligação, o n.º 3.

            13. Neste contexto foi aprovada, pelo Decreto em apreço, a norma contida no artigo 8.º, n.º 3, que estabelece o seguinte:

“O disposto no n.º 1 do artigo 46.º e no n.º 1 do artigo 47.º da Estrutura Orgânica da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, na redação dada pelo presente decreto legislativo regional, tem natureza interpretativa e aplica-se aos exercícios económicos anteriores.”

        14.Pretende-se, em síntese, conferir “natureza interpretativa” ao “disposto no n.º 1 do artigo 46.º e no n.º 1 do artigo 47.º” e aplicá-lo aos “exercícios económicos anteriores.”

          15. A redação que resulta do artigo 8.º, n.º 3 do Decreto em escrutínio pode ser questionada à luz da Constituição.

Vejamos.

             16. A atribuição, a uma lei, de natureza interpretativa pressupõe a necessidade de esclarecer, de interpretar, de elucidar uma norma anteriormente aprovada.

           17. Veja-se, neste sentido, Baptista Machado, que refere o seguinte: «para que a lei nova possa ser interpretativa, de sua natureza, é preciso que haja matéria para interpretação. Se a regra de direito era certa na legislação anterior, ou se a prática jurisprudencial que lhe havia de há muito sido atribuído um determinado sentido, que se mantinha constante e pacífico, a lei nova que venha resolver o respectivo problema jurídico, em termos diferentes, deve ser considerada uma lei inovadora»[3].

          18. Ora não se vislumbra qual a dúvida interpretativa que se colocava, no passado, relativamente ao teor dos artigos 46.º e 47.º, mais a mais sabendo-se que estes dois artigos incorporavam fórmulas matemáticas claras e objectivas que, ao contrário do que por vezes sucede com outras regras jurídicas, tradicionalmente não oferecem qualquer dúvida interpretativa ao operador jurídico.

      19. Na verdade, é certo que as Assembleias Legislativas não dispunham de competência relativamente ao financiamento de partidos políticos até à aprovação, pela Lei n.º 4/2017 de 16 de janeiro, do artigo 5.º, n.º 8 da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais.

      20. Sendo pacificamente aceite que as regras respeitantes aos requisitos e limites do financiamento público dos partidos políticos, enquanto elementos nucleares do seu funcionamento, dos seus direitos e obrigações, à luz da preeminência que detêm no sistema constitucional, por imposição do princípio do Estado de direito e do princípio democrático, integram o âmbito da reserva absoluta de competência legislativa do Parlamento nacional, à luz do disposto nos artigos 51.º, n.º 6 e 164.º, alínea h) da Constituição.

     21. Terá sido, aliás, na decorrência deste entendimento que foi aprovado, em janeiro de 2017, o referido artigo 5.º, n.º 8 da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais que permite que as Assembleias Legislativas possam conceder subvenções anuais a cada partido que haja concorrido a ato eleitoral.

         22. Consequentemente, e estando em causa uma matéria – atribuição de subvenções a partidos – que não podia, até janeiro de 2017, ser concretizada pela Assembleias Legislativa, não pode esta, agora, pretender conferir “natureza interpretativa” ao disposto nos artigos 46.º e 47.º, como decorre do artigo 8.º, n.º 3 do Decreto em apreço.

        23. Questão de natureza idêntica, relativa à natureza interpretativa de uma norma da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais, foi colocada, no passado, ao Tribunal Constitucional, tendo consequentemente sido proferido o Acórdão n.º 801/2014.

       24. Nesse Acórdão n.º 801/2014, o Tribunal Constitucional, suportando-se no Acórdão n.º 535/2014, afirmou o seguinte:

 

“Como se disse no Acórdão n.º 32/87 e se reafirmou nos Acórdãos n.º 372/91 e 139/92, deste Tribunal (todos acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt), “…seja qual for a índole da lei interpretativa em causa, a interpretação autêntica, isto é, a fixação obrigatória (para todos os operadores jurídicos) do sentido de uma norma, feita pelo ‘legislador’ — é algo que integra o próprio exercício da função normativa…”, e por isso só tem legitimidade para tal interpretação — ou seja para impor a injunção nela contida — o próprio autor da norma interpretada, isto é, o órgão que detém competência para, ab initio produzi-la. E nessa atividade o legislador parlamentar está sujeito às regras relativas à forma e ao procedimento que a temática legislativa exige para a sua criação.”

       25.Consequentemente não pode a Assembleia Legislativa pretender conferir natureza interpretativa a uma norma – o artigo 47.º do Decreto em apreço – relativamente à qual não dispunha de competência até à aprovação da Lei n.º 4/2017, de 16 de janeiro, pelo menos com efeitos reportados a momento anterior ao da entrada em vigor desta mesma Lei, o que violaria o disposto nos artigos 51.º, n.º 6 e 164.º, alínea  h) da Constituição.

          26. Acresce que o mesmo artigo 8.º, n.º 3 determina que a “natureza interpretativa” “aplica-se aos exercícios económicos anteriores”.

         27. Sem prejuízo de se saber que não pode ser conferida, à norma em apreço, “natureza interpretativa” fica igualmente por determinar a que “exercícios económicos anteriores” é que esta se refere.

         28Sendo legítimo interrogarmo-nos, de forma exemplificativa, se está em causa o ano económico transacto, os anos decorridos desde o início da legislatura ou até, por absurdo, os últimos dez ou quinze anos.

         29. Aqui suscita-se o princípio da precisão ou determinabilidade das leis, não tendo o artigo 8.º, n.º 3, o requisito da clareza e densidade suficiente para oferecer uma medida jurídica capaz de constituir uma norma de atuação para a administração, impossibilitando também o controlo e a defesa dos direitos e interesses dos cidadãos[4].

          30. Pelo que a não descrição suficientemente precisa dos “exercícios económicos anteriores”, a que se refere o artigo 8.º, n.º 3, traduz uma violação do princípio da legalidade e, em particular, do princípio da precisão ou determinabilidade das leis, violando o disposto no artigo 2.º da Constituição.

III

Da inconstitucionalidade da norma contida no artigo 2.º, que pretende aditar um artigo “48.º-A” ao Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, sob a epígrafe “Antigos Deputados”

         31. A norma em causa pretende criar o estatuto do “antigo deputado” na Região Autónoma da Madeira, surgindo este repartido, no Decreto em apreço, em três grandes conjuntos normativos: (i) o estatuto do “antigo deputado” em sentido estrito, disciplinando o inerente conjunto de direitos e regalias, e possibilidade de atribuição de outros não expressamente previstos; (ii) o regime das associações de “antigos deputados”, enquanto associações de interesse parlamentar, incluindo benefícios e financiamento; e (iii) regras relativas à perda do estatuto de “antigo deputado”, incluindo seus deveres e competência para a determinação da mesma perda.

        32. O regime em causa é inovador na Região Autónoma da Madeira. Com efeito, o estatuto dos deputados à Assembleia Legislativa, constante dos artigos 20.º e seguintes do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (“EPARAM”) não contempla a figura do “antigo deputado”, nem, por conseguinte, quaisquer regras relativas às suas associações. Tão-pouco o diploma respeitante à estrutura orgânica da Assembleia Legislativa, ou qualquer outro diploma regional, contém quaisquer regras a este respeito, o que não surpreende, aliás.

Vejamos.

        33. A figura do “antigo deputado” está consagrada no artigo 28.º do Estatuto dos Deputados, aprovado pela Lei n.º 7/93, de 1 de março (cuja última redação resulta da Lei n.º 16/2009, de 1 de abril). Tal normativo dispõe também sobre associações de antigos deputados. O artigo 29.º da mesma Lei criou ainda a figura do “Deputado honorário” (figura à qual o legislador regional não se dedicou no Decreto em apreço).

        34. Em termos substantivos, há considerável similitude entre o estatuto do “antigo deputado” e suas associações constante do Estatuto dos Deputados acabado de enunciar, e as soluções normativas que, correspondentemente, o legislador regional agora pretende para o “antigo deputado” regional. Note-se, no entanto, que o regime respeitante à perda do estatuto de “antigo deputado” regional não tem qualquer paralelo no Estatuto dos Deputados aprovado pela Lei n.º 7/93, de 1 de março (e subsequentes alterações).

        35. A questão que desde logo se coloca é a de saber se esta matéria está aberta ao legislador regional, ou se, pelo contrário a mesma está reservada aos órgãos de soberania, com a consequente proibição constitucional de ser editada legislação regional a este respeito (artigo 227.º, n.º 1 da Constituição).

          36. O estatuto dos deputados constitui matéria da reserva absoluta da Assembleia da República, nos termos do disposto no artigo 164.º, alínea m) da Constituição da República Portuguesa. Esta norma vai mais longe, reservando ao Parlamento (de forma absoluta) não apenas o “estatuto dos titulares dos órgãos de soberania”, como também o estatuto dos titulares dos órgãos “do poder local, bem como dos restantes órgãos constitucionais ou eleitos por sufrágio direto e universal”.

          37. As Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas preenchem esta dupla qualificação: são órgãos constitucionais, na medida em que a sua existência, estatuto e competências resultam imediatamente da Constituição (sem prejuízo de compleição a jusante, pelos estatutos político-administrativos respetivos); e são órgãos cujos titulares são eleitos por sufrágio universal e direto.

         38. Em comentário ao disposto no artigo 164.º, alínea m), J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira afirmam que “[c]urioso é notar a omissão da menção dos titulares dos órgãos das regiões autónomas. Todavia, o estatuto deles há-de constar do respetivo estatuto regional (arts. 227º, 228º-1 e 232º), cuja aprovação também pertence em exclusivo à AR (cfr. arts. 161º/b e 226º)”[5].

             39. Este comentário deixa implícita uma dúvida, qual seja a de saber se as Assembleias Legislativas estariam abrangidas pela parte final do artigo 164.º, alínea m) da Constituição (que, a nosso ver, estão). Mas é absolutamente inequívoco quanto a que, em qualquer caso, o estatuto dos deputados às Assembleias Legislativas Regionais é matéria de estatuto político-administrativo e, por consequência, matéria absolutamente reservada à competência legislativa da Assembleia da República, por força do disposto no artigo 161.º, alínea b) da Constituição.

           40No mesmo sentido se pronuncia Jorge Miranda, ao afirmar que o estatuto dos deputados regionais é matéria de estatuto político-administrativo, sujeita portanto a reserva absoluta de lei da Assembleia da República[6].

         41. Não restam dúvidas, pois, que o estatuto dos deputados regionais constitui matéria absolutamente reservada à competência legislativa da Assembleia da República.

             42. É certo que, ainda assim, poderia suscitar-se a dúvida de saber se os “antigos deputados”, não estando no ativo e não sendo, efetivamente, titulares do órgão “Assembleia Legislativa”, teriam o seu estatuto abrangido pela referida reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República. Esta dúvida poderia adensar-se em razão do disposto no artigo 24.º, n.º 8, do EPARAM (direitos dos deputados à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira), segundo o qual “[p]or equiparação os deputados gozam ainda dos demais direitos, regalias e imunidades atribuídos aos Deputados à Assembleia da República, consagrados constitucionalmente ou no respetivo Estatuto”. Vejamos.

              43Esta última disposição inserida no EPARAM pretende, como aí se afirma, uma equiparação estatutária em termos de direitos, regalias e imunidades, entre os deputados às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas e os Deputados à Assembleia da República. Assim, quaisquer direitos, regalias ou imunidades que não se encontrem previstos no EPARAM para os deputados regionais, mas que estejam consagrados no Estatuto dos Deputados à Assembleia da República ou na Constituição para estas últimos, serão extensíveis aos primeiros.

           44Não parece, porém, que tal extensão possa aplicar-se ao próprio estatuto de “antigo deputado”. O “antigo deputado” é uma figura a se, até hoje sem correspondência no EPARAM. Caso ela já existisse, poderia considerar-se a possibilidade de uma “equiparação”, nos termos em que se encontra disposto para os deputados em funções. Porém, para que qualquer equiparação possa operar, é necessário que ambos os normativos em relação contemplem a figura ou o estatuto cuja equiparação se pretenda fazer ocorrer. O que não é o caso, pois a figura do “antigo deputado” existe apenas no Estatuto dos Deputados e não no EPARAM.

          45Pode dizer-se, é certo, que a aquisição do estatuto de “antigo deputado” constitui um direito dos deputados em sentido próprio ou efetivo. Mas isso não é suficiente, tudo visto, para fazer operar a extensão por equiparação que se encontra prevista no artigo 24.º, n.º 8 do EPARAM. O estatuto de “antigo deputado” permite ao respetivo titular beneficiar de alguns direitos e regalias que são típicos dos deputados em funções quando deixam de o ser, à semelhança do que sucede nos estatutos de outros titulares de cargos públicos como os magistrados judiciais e os magistrados do Ministério Público.

           46O “antigo deputado”, ao beneficiar de alguns direitos e regalias dos deputados em exercício de funções, pode circular ou permanecer na instituição “Assembleia Legislativa”, o que não deixa de ser politicamente relevante e com implicações no funcionamento do próprio órgão. Daí, aliás, que as associações de antigos deputados possam colher benefícios vários em razão do seu reconhecimento como “de interesse parlamentar”; e também os poderes do Presidente da Assembleia Legislativa quanto ao estatuto do “antigo deputado”[7].

          47Como tal, entende-se que o estatuto de “antigo deputado” não pode consistir num resultado da equiparação constante do artigo 24.º, n.º 8 do EPARAM, sendo inconstitucional o disposto no artigo 2.º do Decreto em apreço, na parte em que adita o artigo 48.º-A ao Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, sob a epígrafe “Antigos Deputados”, por invasão da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, nos termos do disposto nos artigos 161.º, alínea b), e 164.º, alínea m) da Constituição da República Portuguesa.

          48Acresce ainda um outro problema. Na parte em que dispõe sobre associações de “antigos deputados”, o artigo 48.º-A, que o referido artigo 2.º do Decreto em apreço pretende introduzir, suscita igualmente questão de constitucionalidade.

          49Recorde-se o disposto no n.º 3 do artigo 48.º-A: “[a]s associações constituídas por antigos deputados que reflitam pluralidade partidária e democrática, desde que reconhecidas por maioria de dois terços do Plenário da ALM como revestidas de interesse parlamentar, podem beneficiar de apoio logístico e financeiro à sua atividade”. E, de acordo com o n.º 4, “[o] apoio previsto no número anterior é concedido por despacho do Presidente da Assembleia, mediante requerimento dos interessados e sob proposta do Conselho de Administração, ouvido o Conselho Consultivo”.

           50Com efeito, as razões que levam a que a matéria do estatuto dos deputados regionais seja considerada matéria de estatuto político-administrativo bem como, no caso do Decreto em apreço, dos “antigos deputados”, também aqui parecem fazer o seu curso.

         51Na verdade, a matéria das associações de “antigos deputados”, nos termos em que se encontra regulada no artigo 48.º-A, n.º 3 do Decreto em apreço - necessidade da pluralidade partidária, do reconhecimento do “interesse parlamentar” por maioria de dois terços do plenário da Assembleia Legislativa, e, enfim, a possibilidade de as mesmas beneficiarem de apoio logístico e financeiro à sua atividade, a conceder por despacho do Presidente da Assembleia – integra o próprio estatuto do “antigo deputado”.

        52Nestes termos, também na parte em que dispõe sobre o regime das associações de “antigos deputados” o artigo 2.º do Decreto em causa, ao introduzir o regime do artigo 48º-A no Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, é inconstitucional por invasão da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, nos termos do disposto nos artigos 161.º, alínea b), e 164.º, alínea m) da Constituição da República Portuguesa.

        53. Por outro lado, e ainda que pudesse questionar-se até se as associações de “antigos deputados” não seriam qualificáveis como associações políticas, certo é que as mesmas constituem, pelo menos, manifestações da liberdade de associação garantida pelo artigo 46.º da Constituição.

        54. Nessa medida, somos confrontados com uma outra questão de constitucionalidade, uma vez que o Decreto em apreço introduz uma disciplina geral quanto a um certo tipo de associação, no âmbito dos direitos, liberdades e garantias, que é matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, sobre a qual não pode sequer haver (e não houve) autorização legislativa às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas.

        55. A norma em causa é, pois, inconstitucional por violação da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, nos termos do disposto nos  artigos 165.º, n.º 1, alínea b), 227.º, n.º 1, alínea b), e 228.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.

        56. Consequentemente, inconstitucional é também a norma contida no artigo 5.º do Decreto em apreço, que, sob a epígrafe “Associações de interesse parlamentar”, estabelece que “Para efeitos do regime previsto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 48.º-A é reconhecido à “Aedal-Ram – Associação dos Ex-Deputados da Alram” o estatuto de associação e interesse parlamentar.”

   57.Não estão ainda encerradas, contudo, as questões de constitucionalidade que o referido artigo 48.º-A suscita, a respeito do estatuto dos “antigos deputados”, em particular, agora, no tocante à correspondente perda. Recorde-se o disposto nos seus n.ºs 5 e 6:

“Artigo 48.º-A

(...)

(...)

5 – Perde o estatuto de Antigo Deputado, quem:

a)     Não respeitar a dignidade da Assembleia Legislativa e de todos os que nela têm assento e não acatar a autoridade do Presidente da Assembleia.

b)     Com a sua conduta desprestigiar os trabalhos da Assembleia Legislativa.

6 – A perda do estatuto de Antigo Deputado, nas circunstâncias referidas no número anterior, é declarada pelo Presidente da Assembleia Legislativa.”

        58. Sem prejuízo da apontada inconstitucionalidade orgânica, que afeta todo o preceito pelos vários motivos já referidos, há ainda aspetos materiais que importa apreciar.

             59. O que resulta do disposto nos citados n.ºs 5 e 6 do artigo 48.º-A é que, o incumprimento de deveres associados ao estatuto de “antigo deputado” pode conduzir à perda do mesmo, por decisão do Presidente da Assembleia Legislativa, sem que se preveja qualquer tipo de procedimento prévio à tomada da decisão.

            60. Note-se, aliás, que a disciplina contida nos n.ºs 5 e 6 do artigo 48.º-A não tem qualquer paralelo com o disposto no Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93, de 1 de março, já citada). Independentemente das razões para esta imprevisão na legislação nacional, tal significa que nem seria possível qualquer equiparação a este propósito (cfr. supra).

          61. O regime que se pretende criar é claramente de natureza sancionatória, na medida em que associa o incumprimento de deveres por parte do sujeito a uma decisão negativa ou objetivamente desvantajosa para o mesmo.

          62.  Como afirma Paulo Otero, “[a] ideia de um procedimento equitativo, num apelo a um conceito garantístico formulado a propósito do processo judicial, envolve as ideias de justo procedimento ou devido procedimento legal: o princípio do procedimento equitativo é uma decorrência do princípio da justiça e, por essa via, do Estado de Direito material”. E prossegue o mesmo Autor: “Tradicionalmente apontado como tendo a sua origem nos ordenamentos jurídicos britânico e norte-americano, sem prejuízo de diferentes vias de gestação em ambos os sistemas, o princípio do devido procedimento, envolvendo a obrigatoriedade de ser ouvido todo aquele contra o qual se desenvolve uma atividade administrativa lesiva da liberdade e da propriedade, encontra paralelo no designado princípio do procedimento administrativo equitativo ou justo procedimento da tradição romano-germânica: fala-se, neste sentido, num jus commune integrante do “arco constitucional euro-atlântico””[8].

           63Nos termos do artigo 48.º-A, n.ºs 5 e 6, não se prevê qualquer procedimento tendente à decisão final; não se prevê qualquer contraditório por parte do “antigo deputado” supostamente incumpridor dos seus deveres nem se prevê qualquer aspeto ponderativo tocante à decisão final. Na verdade, prevê-se apenas a respetiva competência.

      64Como continua Paulo Otero na sua lição, “[o] princípio do procedimento equitativo determina que, em todas as matérias suscetíveis de envolver consequências prejudiciais para os destinatários (ou, em termos reflexos, para terceiros), os procedimentos devam ser estruturados no sentido de garantir” diversos aspetos (e sintetizamos, obliterando múltiplas considerações do Autor, de modo a não tornar o presente requerimento demasiado extenso, mas para elas remetemos em bloco[9]): “[a] a participação dos interessados na formação da decisões ou deliberações que lhes digam respeito [...]; “[a] efetividade do direito ao contraditório, expressão de “lealdade e probidade” [...]; “[a] produção de uma decisão final, preparada à luz de uma metodologia ponderativa de todos os interesses e factos constantes do procedimento, adotada no respeito pelos postulados da igualdade e da imparcialidade”; “[a] fundamentação da decisão administrativa [...]; “[a] emissão de uma decisão final dentro de um prazo razoável e dotada de publicidade”; (...).

Ainda, “[...] o princípio do procedimento equitativo não pode ser desligado do direito fundamental ao processo equitativo previsto no artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (e, em termos mais remotos, no artigo 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem), nem de um conjunto de corolários procedimentais que o Tribunal de Justiça da União Europeia tem feito decorrer do princípio do Estado de Direito”[10].

Assim, “[e]m Portugal, apesar de a Constituição não consagrar expressamente o princípio do procedimento equitativo, a verdade é que, atendendo à sua natureza de “superprincípio”, incorpora os seus subprincípios nucleares (: informação, fundamentação, notificação e participação), entretanto acolhidos pela jurisprudência constitucional, deles se extraindo a existência de um princípio implícito de justo procedimento:

(i)              [...]

(ii)            A jurisprudência do Tribunal Constitucional, a propósito da contraprova da condução de veículos sob a influência do álcool, desde cedo faz referência ao due processo f law ao nível das garantias de defesa dos particulares no âmbito da sua relação com autoridades administrativas [aqui com referência ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 365/92, de 12 de novembro de 1992];

(iii)          [...]

(iv)           Mostra-se ainda possível observar o acolhimento pela jurisprudência administrativa do princípio do due process of law no âmbito de procedimentos administrativos de natureza sancionatória [aqui com referência ao Acórdão da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 30 de setembro de 2014, proferido no processo n.º 1012/14].[11]

           65Nestes termos, conclui Paulo Otero que “[i]ndependentemente das vias de subjectivização jusfundamental do direito a um procedimento equitativo, certo é que estamos diante de um direito fundamental sujeitos aos princípios constitucionais aplicáveis aos direitos de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, uma vez acolhido pela cláusula aberta do artigo 16º, nº 1, ou extraído interpretativamente do princípio da justiça do agir administrativo. [§] A violação do princípio do procedimento equitativo, traduzindo-se na ofensa ao direito fundamental a um procedimento equitativo, mostra-se suscetível de, sem prejuízo da responsabilidade civil por danos morais, gerar um efeito invalidante das respetivas condutas administrativas: se essa violação atingir o “conteúdo essencial” do direito fundamental, a lei determina a nulidade do ato jurídico”[12].

        66No caso em apreço, o estabelecimento de um procedimento devido (“due process of law”) seria ainda mais relevante, em face das cláusulas gerais utilizadas no n.º 5 do artigo 48.º-A, para compor os deveres do “antigo deputado”, a saber, “a dignidade da Assembleia Legislativa”, “a autoridade do Presidente da Assembleia”, “desprestigiar os trabalhos da Assembleia”.

             67Posto o que antecede — e muito embora tudo aponte no sentido de que a decisão quanto à perda do estatuto de “antigo deputado” revista natureza administrativa sancionatória —, o ponto é que nos encontramos perante a violação de um direito fundamental e de um princípio constitucional: o direito ao procedimento equitativo[13].

               68O direito ao procedimento equitativo (“due process of law”) é um direito análogo aos direitos, liberdades e garantias, constitucionalmente protegido por via da cláusula aberta do artigo 16.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa. Este direito constitui expressão dos princípios da justiça e da imparcialidade, na medida em que os mesmos não se acham realmente salvaguardados senão através da procedimentalização das decisões dos órgãos públicos. O disposto no artigo 48.º-A, n.º 6, introduzido pelo artigo 2.º do Decerto em apreço viola, pois, o direito ao procedimento equitativo, nos termos expostos.

             69Nesta medida, o disposto no artigo 48.º-A, n.º 6, introduzido pelo artigo 2.º do Decreto em apreço, constitui também uma restrição arbitrária ao direito fundamental ao procedimento equitativo, em violação dos artigos 2.º (Estado de Direito democrático) e 18.º, n.ºs 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa.

       70Aliás, na medida em que o direito ao procedimento equitativo constitui um direito análogo aos direitos liberdades e garantias, verifica-se igualmente uma inconstitucionalidade de natureza orgânica, na medida em que a matéria dos direitos, liberdades e garantias se encontra na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, sem possibilidade sequer de autorização às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas (artigos 227.º, n.º 1, alínea b), e 228.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa).

Nestes termos, requer-se ao Tribunal Constitucional a apreciação preventiva da constitucionalidade das seguintes normas do Decreto enviado ao Representante da República para assinatura como Decreto Legislativo Regional intitulado “Oitava alteração do Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, que estabelece a estrutura orgânica da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira”, com os fundamentos expostos, e em síntese:

(i)    Da norma contida no artigo 8.º, n.º 3 do Decreto em apreço, por violação dos artigos 2.º, 51.º, n.º 6, e 164.º, alínea h), 227.º, n.º 1, alínea a) e 228.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa;

(ii)  Da norma contida no artigo 1.º do Decreto em apreço, que adita o artigo 48.º-A ao Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro, em matéria de estatuto dos “antigos deputados”, suas associações e regime de perda de estatuto, por violação do disposto nos artigos 2.º, 16.º, n.º 1, 18.º, n.ºs 2 e 3, 161.º, alínea b), e 164.º, alínea m), 165.º, n.º 1, alínea b), 227.º, n.º 1, alínea a) e 228.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa;

(iii)                Consequentemente, da norma contida no artigo 5.º do Decreto em apreço, que reconhece o estatuto de associação e interesse parlamentar a uma associação de “antigos deputados”, por violação das disposições constitucionais acima referidas em (ii).

            Queira Vossa Excelência aceitar os mais respeitosos cumprimentos,

            Lisboa, 15 de março de 2017

O REPRESENTANTE DA REPÚBLICA

(Ireneu Cabral Barreto)

 

 

 

 

 

 

* Segue em anexo cópia do Decreto a que se reporta o presente requerimento



[1] Doravante, referir-nos-emos a este regime jurídico pela mera identificação do diploma — “Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de setembro” — ou pela referência ao seu conteúdo material — “estrutura orgânica da Assembleia Legislativa”.

[2] Cfr. Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, com as alterações introduzidas pelo decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, Lei n.º 1/2013, de 3 de janeiro, Lei Orgânica n.º 5/2015, de 10 de abril e Lei n.º 4/2017, de 16 de janeiro.

[3] Cfr. Introdução ao Direito e ao Discurso legitimador, Almedina, Coimbra, 2014, p. 267.

[4] Sobre o princípio da determinabilidade das leis cfr., na jurisprudência do Tribunal Constitucional, inter alia, os Acórdãos n.º 285/92 e 387/2012, ambos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt

[5] Cfr. J. J. Gomes Canotilho / Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa – Anotada, II, 4.ª Ed., Coimbra Editora, p. 314.

[6] Cfr. Jorge Miranda, “Artigo 164.º (Reserva absoluta de competência legislativa”, in Jorge Miranda / Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, II, Coimbra Editora, 2006, p. 521.

[7] Que suscitam, por si só, outros problemas de constitucionalidade: cfr. infra.

[8] Cfr. Paulo Otero, Direito do Procedimento Administrativo, I, Almedina, 2016, pp. 73-74 (a última expressão entre aspas pertence a Sérvulo Correia

[9] Cfr. Paulo Otero, Direito do Procedimento Administrativo, I, pp. 75 ss.

[10] Cfr. Paulo Otero, Direito do Procedimento Administrativo, I, p. 77.

[11] Cfr. Paulo Otero, Direito do Procedimento Administrativo, I, cit., pp. 79-80.

[12] Cfr. Paulo Otero, Direito do Procedimento Administrativo, I, p. 82.

[13] Veja-se que, a respeito da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, para que o citado artigo 6.º, n.º 1 se aplique, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, “não é necessário que o litígio seja entre duas pessoas privadas e pouco importa a natureza da lei, segundo a qual a determinação deve ser julgada (lei civil, comercial, administrativa, etc.) e a autoridade competente na matéria (jurisdição de direito comum, órgão administrativo, etc.)”: cfr. Ireneu Cabral Barreto, Convenção Europeia dos Direitos do Homem – Anotada, 5.ª Ed., Almedina, 2016, p. 157.