Cerimónia Comemorativa
106.º Aniversário do Armistício da Grande Guerra
50.º Aniversário do Fim da Guerra do Ultramar
101.º Aniversário da Liga dos Combatentes
Intervenção do Representante da República para a
Região Autónoma da Madeira
- 10 de novembro de 2024 -
É com muito gosto que, de novo, estou presente nesta cerimónia que assinala o triplo aniversário do Armistício da Grande Guerra, do Fim da Guerra Colonial e da Liga dos Combatentes.
Num gesto que pretendo ser de comemoração, mas também de agradecimento e memória.
De agradecimento, desde logo, à Liga dos Combatentes e, em particular, ao seu núcleo do Funchal. Creio que esta instituição, que justamente se orgulha de estar «há mais de 100 anos ao serviço dos Combatentes», merece a gratidão de todos.
Este reconhecimento não é devido unicamente pelos Combatentes e seus familiares, mas por toda a nossa comunidade. Não esqueçamos que os homens – e, em tempos mais recentes, as mulheres – Combatentes foram-no, e são-no, ao serviço de Portugal.
É, portanto, a todos nós que cabe agradecer os serviços prestados pelos nossos Combatentes e o apoio que aos mesmos é dado pela Liga dos Combatentes.
Minhas Senhoras, Meus Senhores,
Este é também um momento propício ao exercício da memória. Cada vez mais podemos ser tentados a questionar a relevância de se assinalar as tréguas de dois conflitos que, inevitavelmente, com o passar dos anos, ficam cada vez mais longe de nós.
A lei da vida impôs-se e já não temos entre nós qualquer Combatente da Primeira Grande Guerra. E dos conflitos em África também algumas memórias se vão desvanecendo.
Julgo que estas circunstâncias, ao invés de nos fazerem ceder à tentação do esquecimento, nos devem animar a recordar o Armistício da Grande Guerra e o Fim da Guerra Colonial.
Por duas ordens de razão: para recolher lições da História, e para homenagear, sempre, quem pela Pátria lutou e luta.
Minhas Senhoras, Meus Senhores,
Quando, por vezes, se tentam fazer paralelismos entre momentos históricos, cruzamo-nos com uma conhecida citação de Mark Twain, que terá escrito que «a história nunca se repete, mas muitas vezes rima».
Penso que esta passagem, sem deixar de sublinhar que o mundo não será no futuro o que já foi no passado, tem o mérito de alertar para a conveniência de darmos ouvidos aos ecos desse tempo que já lá vai.
Convém recordarmos que, se a Grande Guerra teve como casus belli o assassínio do Arquiduque Francisco Fernando em Sarajevo, os beligerantes foram caminhando, como sonâmbulos, para este conflito.
E, uma vez chegados aos campos de batalha, uma guerra que os dirigentes assumiam que seria resolvida em pouco tempo, arrastou-se por quatro anos, ao longo dos quais se ceifaram milhões de vidas.
Talvez um qualquer observador que vivesse em 1918 pensasse, face à desolação que se havia acabado de verificar, que nunca mais tal nível de conflitualidade se iria repetir.
E não se repetiu, de facto. Mas, recuperando a citação de Mark Twain, rimou. E rimou demasiadas vezes. E ainda hoje rima, na Ucrânia, no Médio Oriente e em tantos outros pontos do nosso planeta.
Pela minha parte, é com apreensão que não consigo deixar de ouvir esses ecos de há 100 anos. A invasão da Ucrânia pela Rússia deu-se há já mais de dois anos e meio, e as notícias que de lá nos chegam não permitem vislumbrar a Paz. No Médio Oriente, parece agora ter-se entrado num tétrico jogo de parada e resposta, cujo fim ainda não se entrevê.
Pelo meio, sofrem as mesmas vítimas de sempre: os soldados, mas também os civis, incluindo mulheres, crianças e idosos, que em nada contribuíram para a guerra.
Espero, portanto, que, de uma vez por todas, tenhamos tirado as corretas lições da história e que, passo a passo, não nos dirijamos, adormecidos, para conflitos mais globais. Com os meios com que hoje se podem travar as guerras, um novo conflito global tem, literalmente, o potencial de destruir o Mundo tal qual o conhecemos.
Minhas Senhoras, Meus Senhores,
De 1961 a 1974 – durante treze anos, portanto – toda uma geração foi mobilizada para Angola, para a Guiné e para Moçambique. Fazendo as contas apenas às Forças Armadas portuguesas, cerca de 10.000 Combatentes não regressaram às suas famílias, mais de 20.000 ficaram com mazelas físicas para toda a vida, e talvez nunca saibamos quantos os que sofreram e ainda sofrem psicologicamente por força da sua participação num conflito que, certamente, não desejavam.
Após o seu regresso, os militares tiveram de enfrentar não só o desafio do seu retorno à vida civil, de reconquistar o seu lugar na sociedade, mas ainda as sequelas da guerra.
Estes homens e as suas famílias não podem ser esquecidos, pois são uma parcela de um saldo demasiado negativo, resultado de uma guerra feita na contramão dos ventos da história.
Já louvei o trabalho que a Liga tem vindo a desenvolver em prol destes ex-Combatentes, e no qual se incluem estruturas de apoio médico, psicológico e social. Fosse esta apenas a sua atuação e já estaria muito bem justificado o estatuto de utilidade pública que lhe foi atribuído.
Valorizando este meritório trabalho, sinto que devo ainda chamar a atenção para o papel que o Estado e outras entidades públicas, nos diferentes níveis, devem desempenhar no apoio aos ex-Combatentes.
Não apenas com gestos importantes e carregados de simbolismo, como o que na próxima semana vai ter lugar na minha terra natal, na Ponta do Sol. Aí, por iniciativa da sua Câmara Municipal, vai ser inaugurado um Monumento Alusivo aos Combatentes.
Mas, às autoridades públicas em geral caberão tarefas de apoio de maior monta. Todos sabemos que muito se tem avançado nesta matéria, nomeadamente através da aprovação do Estatuto do Antigo Combatente, o qual, de resto, a nossa Assembleia Legislativa já fez adaptar à Região.
Não são de desprezar as vantagens que podem já ser auferidas ao abrigo deste estatuto, nomeadamente a isenção do pagamento de taxas moderadoras, ou a isenção de pagamento do passe social. E mesmo a promoção do acesso à cultura, através das entradas gratuitas em museus e monumentos. Ou, noutro patamar, o direito a honras fúnebres com a bandeira nacional.
Todavia, pergunto-me se estes homens que passaram pelos maiores sacrifícios – e as suas famílias – não são credores de outros benefícios. Não será possível alargar as vantagens de que os mesmos gozam?
Já no passado fiz esta pergunta, e o tempo parece ter-me dado razão. Por exemplo, aí está a programada comparticipação a 100% na compra de medicamentos.
O que me entusiasma a voltar a questionar os valores atribuídos ao Suplemento Especial de Pensão e ao Acréscimo Vitalício de Pensão. Em ambas as situações estão em causa montantes que podem, na melhor das hipóteses, ir até pouco mais de €170, pagos uma vez ao ano.
Todos somos testemunhas do aumento do custo de vida nos anos mais recentes, pelo que creio que todos comungaremos da ideia de que o referido montante pouco impacto terá na melhoria da situação económica de quem o recebe.
Talvez possa ser altura de repensar estas prestações, por um lado, sujeitando-as a condição de recursos; e, por outro lado, fazendo aumentar substancialmente o valor das prestações que vierem efetivamente a ser atribuídas. Certamente que seria uma via mais justa, atribuindo aos que mais precisam uma compensação de maior dignidade, que possa corresponder minimamente ao reconhecimento que tanto merecem.
Minhas Senhores, Meus Senhores,
Em dia de triplo aniversário de datas que dizem respeito aos nossos Combatentes, permitam-me uma palavra final.
Para vós, militares, e às vossas famílias, agradecer tudo o que fizestes pelo nosso País. Dos que partiram, ficam as suas memórias, aos que estão entre nós, manifestamos a nossa gratidão.
Vivam os nossos Combatentes!
Viva a nossa Região Autónoma da Madeira!
Viva Portugal!