Saúdo e agradeço a vossa presença nesta Cerimónia que celebra, na Região Autónoma da Madeira, o dia 10 de Junho.
Cumprimento em particular os nossos emigrantes, que acabámos de lembrar numa singela homenagem na Avenida do Mar. Com a sua visão do Mundo e o seu apego sempre renovado aos valores da portugalidade, a nossa Diáspora constitui uma parte essencial de nós.
Hoje comemoramos Portugal, o nosso Poeta maior, as comunidades portuguesas, que nos tornam uma nação universal.
Fazemo-lo neste ano em que coincide cumprirem-se 500 anos do nascimento de Luís de Camões e 50 anos da Revolução dos Cravos.
Pelo que se impõe que comece justamente por invocar Camões, como símbolo da nossa História e do orgulho que temos no nosso passado.
É, portanto, um dia carregado de simbolismo onde, ano após ano, olhamos para nós próprios e para o nosso percurso, como Estado, como Pátria de oito séculos.
Mas o significado deste dia 10 de junho pede-nos mais.
Convoca-nos a todos, como cidadãos, para ir além de um mero assinalar da data, mais ou menos rotineiro.
Temos, hoje, de olhar para ontem com a visão no amanhã.
Porque, como bem lembra José Tolentino Mendonça, “As memórias são, como se sabe, moedas para serem usadas no país do futuro”.
Essa reflexão, cada vez mais necessária, é uma responsabilidade que, numa democracia sólida como é a nossa, cabe a todos.
Em nome das próximas gerações, é urgente e imperioso continuarmos, com energia renovada, a comemorar Portugal.
Minhas senhoras e meus senhores,
Neste ano em que se completa já meio século desde a data em que fizemos a mais bonita revolução da nossa História, que deu finalmente ao povo português o direito de ser dono do seu destino, é fundamental celebrarmos o muito que a Liberdade e a Democracia nos trouxeram.
E permitam-me agradecer a quem lá esteve empenhado nesse dia.
Temos o gosto de ter connosco, nesta cerimónia, dois dos cinco madeirenses que integraram a coluna militar que saiu de Santarém, na madrugada do dia 25 de abril, ao encontro da História.
Saúdo e agradeço, nas pessoas dos antigos militares Avelino Catanho Ribeiro e Henrique Artur Silva, todos os que nesse dia arriscaram a sua vida para nos restituírem a liberdade.
Obrigado pela coragem, pela determinação e pelo sentido de dever.
Graças a vós, e aos vossos companheiros, vivemos aquele dia magnífico em que, como escreve Sophia, “como puro início / como Tempo Novo / sem mancha nem Vício”, Portugal voltou a respirar livremente.
Permitam-me também que, repetindo o que já expressei publicamente, partilhe convosco a inquietação que sinto ao ver algumas sombras que ameaçam a nossa Democracia, tão duramente conquistada.
Só quem nunca viveu em ditadura pode pensar em prescindir do seu direito a escolher e participar nas decisões sobre o nosso futuro, em nome da segurança e da suposta estabilidade sob as ordens de um qualquer líder iluminado.
Nunca, em nenhuma latitude, a falta da Democracia conseguiu a felicidade para as pessoas comuns.
É, pois, fundamental continuarmos a defender a Democracia, esse direito de formarmos e expressarmos a nossa opinião, de decidirmos livremente sobre as nossas opções, de elegermos quem vai exercer o poder em nosso nome e sermos, todos, corresponsáveis pelo nosso futuro coletivo.
Dito isto, sabemos todos que a Democracia tem imperfeições que devemos, a cada momento, tentar corrigir.
Deixem-me referir brevemente três temas sobre os quais, sobretudo agora que passámos o período eleitoral, me parece importante refletir.
Primeiro, as questões em aberto na lei eleitoral.
Se temos hoje um problema de falta de participação cívica, da qual a elevada abstenção eleitoral é uma consequência preocupante, é mister que se dê o direito de votar a todos os cidadãos portugueses que pretendem fazer valer a sua voz e, por limitações de contexto, não o podem fazer.
Ainda não foi desta vez que os nossos emigrantes puderam votar para as eleições regionais, nem que todos os eleitores que o pretendiam conseguiram votar antecipadamente em mobilidade. São temas que merecem um esforço de concretização no futuro que se espera próximo.
Depois, a questão da qualidade da informação aos cidadãos.
Nestes tempos de excesso de palavras e de imagens, em que todos os factos aparecem como contingentes e a verdade parece estar em permanente neblina, é crucial termos uma Comunicação Social que informe com critérios de rigor, isenção e clareza, para evitar que os cidadãos, e sobretudo os jovens, por entre o ruído e a demagogia, se possam desencantar da Democracia.
Mas, para tanto, é necessário que a sociedade garanta aos órgãos e profissionais da Comunicação Social as condições de independência relativamente ao poder político do momento e a outros poderes e interesses não escrutinados.
Finalmente, temos de melhorar a qualidade do ambiente também ao nível do debate político.
É importante que todos os eleitos privilegiem o debate de ideias, a tolerância pelas diferenças, a transparência dos seus atos e a credibilidade do seu exemplo, sob pena de estarem a promover soluções de demagogia retórica que nunca resolverão os problemas das pessoas.
É fundamental, permitam-me dizê-lo, que todos os titulares dos cargos públicos percebam que o estatuto e o poder que transitoriamente detêm só são legítimos enquanto meios ao serviço do bem comum.
É necessário um esforço, ativo e concertado entre todos, para eleger prioridades, definir estratégias e gerir recursos públicos.
E tenho a absoluta certeza de que a Democracia encontra sempre o caminho certo.
Assim, a propósito da atual situação política regional, e porque o Governo Regional não dispõe de maioria absoluta, a vontade popular determinou o reforço do papel da Assembleia Legislativa como órgão fundamental na tomada de decisões.
E quero manifestar a minha esperança e convicção de que será possível, no atual contexto e através de diálogo entre as diversas forças partidárias, conseguir as soluções que permitam manter a nossa Região no caminho da estabilidade política, da paz social e do desenvolvimento.
Porque, não devemos esquecê-lo nunca, uma das maiores conquistas do 25 de abril e da Constituição da República de 1976 foi a Autonomia política das regiões insulares, que permitiu trazer à Madeira e aos Açores um progresso económico e social que a todos nos deve orgulhar.
E que é nossa responsabilidade continuar a construção da Autonomia, para entregarmos uma terra de desenvolvimento e paz às gerações futuras.
Minhas senhoras e meus senhores,
Infelizmente, ao olhar o Mundo à nossa volta, os receios pelo futuro da Paz e da Democracia aumentam.
Aqui bem perto de nós – em solo europeu – testemunhamos as barbáries e o sofrimento aos quais um regime não democrático pode levar. Refiro-me à guerra que há mais de dois anos a Federação Russa encetou contra a Ucrânia.
Não fora suficiente este flagelo, eis que assistimos ao recrudescer do conflito no Médio Oriente, em particular na Faixa de Gaza.
Na Ucrânia e em Gaza demanda-se a paz. Uma tão simples palavra, que esconde um tão difícil desiderato. E que contributo podemos nós, Portugal, dar para a paz?
Por paradoxal que possa parecer a alguns, num Mundo repleto de perigos e incertezas, o nosso contributo para a paz passa por reforçar a nossa capacidade defensiva, pelo aumento do efeito dissuasor das nossas Forças Armadas.
Que não existam equívocos quanto a esta matéria: as Forças Armadas, atuando no contexto das alianças firmadas por Portugal, foram, são e serão um garante da nossa soberania.
Os últimos anos tiveram o condão de recordar a necessidade de termos umas Forças Armadas profissionalizadas, o que implica atuar na dupla vertente de meios humanos e meios materiais.
Os madeirenses e porto-santenses bem sabem que as Forças Armadas lá estão sempre que são necessárias. Pelo que também, coletivamente, é nossa obrigação retribuir este apoio aos nossos militares.
Minhas senhoras e meus senhores,
Somos afortunados por vivermos nas mais belas ilhas do Atlântico.
Infelizmente, esta beleza natural é obrigada a conviver com alguns problemas sociais cuja solução não podemos adiar.
A criminalidade geral e a criminalidade violenta e grave, incluindo a violência doméstica, continuam com índices muito elevados.
As causas de tudo isto não são fáceis de identificar.
O alcoolismo e o consumo de drogas, incluindo as chamadas drogas sintéticas, pela degradação da saúde própria, mas também pela insegurança que promovem, carecem de um combate persistente por parte das autoridades e da vigilância e empenho da sociedade civil.
No que respeita ao álcool, pergunto-me se não seria desejável que todas as entidades públicas fossem mais ativas na promoção de campanhas que deixem bem claro que o consumo de bebidas alcoólicas, quando excessivo, não só não é socialmente aceitável, como é um verdadeiro problema de Saúde pública.
Em relação ao tráfico de drogas sintéticas, como é sabido, as Regiões Autónomas não têm competência para legislar a respetiva criminalização. Mas, pela particular incidência que este comportamento tem entre nós, os Órgãos de Governo próprio da Região e os nossos Deputados à Assembleia da República andarão bem se continuarem a sensibilizar a Assembleia da República para a necessidade de legislar nesta matéria.
Um outro aspeto que gostaria de enfatizar, para terminar, é o crime de violência doméstica, cujos números continuam a envergonhar uma Região tradicionalmente pacífica como a nossa.
Chegou o tempo de, nos casos de violência doméstica, fazer sair o agressor da casa de família e de se deixar de continuar a beneficiar o infrator, prejudicando as vítimas.
Minhas senhoras e meus senhores,
Estas comemorações do 10 de junho na Região Autónoma da Madeira incorporam sempre dois momentos que considero, cada um à sua dimensão, particularmente significativos.
No passado sábado, nesta sala, tivemos ocasião de ouvir e premiar os quatro primeiros classificados no concurso literário dedicado ao Dia de Portugal.
Trata-se de uma iniciativa que tem sempre contado com a presença e com o apoio do Senhor Secretário Regional da Educação, Ciência e Tecnologia, a quem muito agradeço, e que pretende distinguir trabalhos de alunos das escolas da Região.
É um modesto contributo para motivar os jovens a refletirem sobre o nosso País, a nossa História, a nossa identidade e o nosso futuro, e pretende simbolizar a importância central que têm a Educação e a Cultura na formação dos cidadãos do Portugal do amanhã.
E, como teremos ocasião de concluir da leitura do trabalho classificado em primeiro lugar, mesmos nestes tempos de acelerada mudança tecnológica e cultural, continua a haver entre muitos dos nossos jovens o gosto pela leitura, pela escrita e pela reflexão.
O segundo momento é a entrega das condecorações atribuídas por S.Exa. o Presidente da República.
Neste dia 10 de junho, foram condecorados pelo Senhor Presidente da República, sob minha proposta, que só a mim me responsabiliza, (mas quero agradecer apoio o que sempre tenho recebido do Senhor Presidente do Governo Regional), três individualidades e uma Instituição, que se destacaram pelos seus feitos e contributos para uma sociedade melhor.
Serão em seguida condecorados:
- Maria Amélia Carreira Rebelo, com o título de Comendador da Ordem da Liberdade;
- Saturnino Figueira da Silva, com o Grau de Comendador da Ordem do Mérito;
- Zélia Maria Ferreira Gomes, com o Grau de Oficial da Ordem do Mérito;
- A Associação Presença Feminina, com o título de Membro Honorário da Ordem do Mérito.
Este ano as condecorações destacam, respetivamente;
- A par da longa uma carreira no ensino que atravessou gerações de alunos, um percurso notável e pioneiro de sindicalista e ativista das causas da democracia, da emancipação feminina e da dignificação do estatuto do professor, antes e depois do 25 de abril, reconhecidamente desenvolvidas com grande espírito cívico e independência. Como o seu marido, nesses tempos tristes, havia sempre alguém que resistia e dizia não.
- Uma dedicação profissional de décadas à causa da Saúde Mental, que melhorou radicalmente a abordagem científica da doença, sempre combatendo estigmas e preconceitos, e lançou as bases para o combate e prevenção do consumo de álcool e drogas na nossa sociedade.
- Um trabalho de excelência na formação musical de várias gerações de jovens, que em muito contribuiu, em particular, para o elevado nível do canto coral de que a Região Autónoma da Madeira justamente se orgulha.
- O trabalho social continuado e persistente, tantas vezes invisível, de defesa dos direitos, promoção e dignificação das mulheres, com particular ênfase no apoio às vítimas de violência doméstica, flagelo infelizmente ainda tão presente na nossa Região, como referi antes.
Mas mais importante que destacarmos percursos passados, devemos ver nos condecorados uma referência para o futuro.
E olhar para o seu trabalho e dedicação à comunidade como um exemplo que fica para as novas gerações, e para os tempos exigentes que nos aguardam.
Minhas senhoras e meus senhores,
Neste dia em que celebramos o Dia de Portugal, é impossível olhar para o passado sem sentir orgulho no caminho que fizemos.
E, daí, encarar o futuro com otimismo.
Neste ano em que celebramos 50 anos da Revolução dos Cravos, termino citando Maria Teresa Horta:
“Deixo que a Palavra tão incerta teça
A Liberdade a meio desse abril
Para que a memória de Portugal não esqueça.”
Viva a Região Autónoma da Madeira!
Viva Portugal!