ALOCUÇÃO PROFERIDA PELO REPRESENTANTE DA REPÚBLICA PARA A REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA NA CERIMÓNIA DE ENTREGA DE CONDECORAÇÕES POR DELEGAÇÃO EXPRESSA DE SUA EXCELÊNCIA O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, NO DIA 10 DE JUNHO DE 2023, DIA DE PORTUGAL, DE CAMÕES E DAS COMUNIDADES PORTUGUESAS, NO PALÁCIO DE SÃO LOURENÇO
Saúdo a vossa presença nesta Cerimónia que celebra, na Região Autónoma da Madeira, o dia 10 de Junho.
Neste dia de festa, quero começar por expressar a minha solidariedade aos que sofreram com os efeitos da tempestade “Óscar”, prestar a homenagem a todos, elementos da proteção civil, serviços do IPMA, forças de segurança e forças armadas que tanto contribuíram para minimizar os seus efeitos e deixar uma palavra de gratidão ao Regimento de Guarnição nº 3, mais uma vez porto de abrigo e refrigério para os mais atingidos.
Hoje comemoramos Portugal e os portugueses, evocamos a nossa língua através da sua voz maior, Luís de Camões, e relembramos as nossas Comunidades da Diápora, que nos ampliam para uma dimensão global no Mundo.
De todas as datas que percorrem o nosso calendário, esta é aquela que, enquanto comunidade, mais nos deve unir e fazer refletir no nosso percurso enquanto País.
Celebramos o nosso passado, mas, sobretudo, olhamos para o que queremos do nosso destino comum enquanto Pátria, neste Mundo que caminha, também ele, por “mares nunca dantes navegados”, numa voragem de mudança.
E onde cada vez menos teremos oportunidades de parar e pensar para onde vamos, onde estaremos nos anos que virão, e que País deixaremos aos nossos descendentes.
Em nome das próximas gerações, é urgente e imperioso continuarmos, com energia renovada, a comemorar Portugal.
E fazermo-lo hoje também aqui, nesta Região Autónoma da Madeira, é igualmente fundamental.
Não porque haja qualquer necessidade de reafirmar sentimentos de unidade nacional, que ninguém seriamente questiona ou ameaça.
Mas porque a realidade que é hoje o nosso País não seria a mesma se não fossem as suas Regiões Autónomas.
Em boa verdade, Portugal só alcançou a identidade nacional quando, passam já seiscentos anos, se libertou do acantonamento peninsular e em frágeis caravelas se fez ao Mundo e a um destino maior.
Quando, chegando ao Porto Santo e à Madeira, deixou de ser apenas a “ocidental praia” da Europa, que os ventos da história facilmente podiam ter varrido, para se tornar uma nação universal.
Comemorar o Dia de Portugal nesta Região Autónoma da Madeira é lembrar aquilo que nos torna únicos.
É evidenciar a nossa permanente determinação de não nos conformarmos com um território pequeno e pobre, e içarmos as velas à procura de outros espaços.
É falar da nossa coragem de termos chegado mais longe que todos os outros.
Comemorar o Dia de Portugal é exaltar o nosso humanismo, o nosso universalismo, o nosso sentido inato de justiça e solidariedade, que nos permite renovar a cada ano a esperança num futuro melhor para todos.
Minhas senhoras e meus senhores,
Celebrar o Dia de Portugal nesta Região é também festejar um dos maiores sucessos do Portugal democrático moderno, saído da revolução de abril e consolidado na Constituição da República de 1976.
Esse sucesso é a autonomia política das Regiões insulares.
Que permitiu, dando às comunidades insulares poderes e recursos para tomarem as suas próprias opções de desenvolvimento, que se transformasse uma Região pobre e totalmente dependente, como era o arquipélago da Madeira em 1974, num moderno território europeu que olha o futuro com confiança.
Mais do que números abstratos do crescimento económico, foi a Autonomia quem possibilitou, em passo acelerado, o acesso da generalidade dos cidadãos à satisfação das suas necessidades básicas, a cuidados de saúde modernos, a uma habitação condigna, a uma educação inclusiva e a uma oferta cultural ampla, numa sociedade que é hoje muito menos desigual e injusta.
É, por conseguinte, importante reafirmar, neste dia em que celebramos Portugal em toda a sua diversidade, que a Autonomia é uma conquista que deve orgulhar não só os madeirenses e os açorianos, mas todos os portugueses.
Como é importante reafirmar que a Autonomia é uma construção dinâmica, que pode e deve evoluir.
Pelo que será sempre legítimo refletir sobre aquilo em que pode ser melhorada, e que os representantes democráticos decidam, em razão dessa reflexão, introduzir mudanças no regime atual.
Tenho a convicção, porém, que mais que introduzir alterações ao quadro legislativo que tão bom resultado permitiu, o caminho deverá passar por aproveitar até ao limite os poderes que a Constituição e o Estatuto Político-administrativo conferem aos órgãos de governo próprio.
Da minha parte, continuarei sempre a trabalhar para que a Autonomia possa funcionar em pleno.
Procurando ser um contributo para as soluções, e nunca para o acréscimo de dificuldades.
Desejando ser um fator de apaziguamento e consenso entre a República e a Região, e entre as forças políticas locais.
Colaborando ativamente nas várias fases do processo legislativo, por forma a prevenir e evitar questões de desconformidade constitucional, o que a minha presença próxima e o conhecimento das realidades facilita.
Incentivando, inclusive, os órgãos próprios da Região à adoção de medidas legislativas em áreas que me parecem relevantes, como recentemente fiz a respeito da criminalização do tráfico das novas substâncias psicoativas ou da transferência de poderes para as autarquias locais.
É este caminho que tenho seguido e que, como Representante da República, madeirense e autonomista convicto, pretendo continuar.
Minhas senhoras e meus senhores,
Neste dia, em que celebramos Portugal, não podemos deixar de olhar para o Mundo e para as Comunidades portuguesas espalhadas pelos cinco continentes.
E em especial a diápora madeirense, que temos homenageado no início deste dia, depondo flores no Monumento ao emigrante, como expressão do nosso respeito, apreço e saudade.
Agradecendo-lhes a imagem que construiram do nosso País e da nossa Região, mercê do seu trabalho e integridade.
E, se souberam integrar-se nas Nações que os acolheram, nunca se esqueceram da terra onde nasceram, sabendo que a sua saudade é também a nossa.
Duas dessas comunidades merecem a nossa atenção particular.
Na África do Sul, onde vivem tantos compatriotas nossos, com os quais em boa hora o Senhor Presidente da República escolheu comemorar este Dia, chegam sinais inquietantes do aumento de instabilidade e insegurança.
Que a visita de Sua Excelência tenha servido de lenitivo para as inquietações e lhes confira a força para superarem os seus receios.
A outra situação preocupante é a vivida na Venezuela, terra escolhida por milhares de madeirenses.
Quero reafirmar a nossa solidariedade, o nosso apoio e a nossa vontade para ajudá-los nas dificuldades de vária ordem.
Efetivamente, muito do que vemos pelo Mundo enche-nos de apreensão.
Na Ucrânia, paredes meias com a União Europeia, centenas de milhares de pessoas passam todas as noites em abrigos antiaéreos, com medo de uma guerra bárbara, inútil e sem fim à vista, que já matou e feriu tanta gente inocente.
Em tantos países, de todos os continentes, cada vez mais se gastam em armamento recursos escassos e preciosos, que podiam e deviam ser usados para mitigar o sofrimento de milhões de pessoas, que continuam a ter de suportar privações básicas.
E aqui, no mundo ocidental desenvolvido e rico, onde ingenuamente consideramos que a democracia e a liberdade são dados adquiridos, vemos crescer os populismos, a xenofobia, a intolerância, o egoísmo e o relativismo ético.
Em todos os casos, é evidente que algo está a falhar.
E, se as causas são porventura complexas, sabemos bem, como portugueses ciosos do caminho de oito séculos que nos trouxe até aqui, quais as soluções.
Precisamos de mais humanismo, precisamos de mais e melhor democracia.
Hoje, que atingimos níveis de desenvolvimento e justiça social assinaláveis, ainda que insuficientes.
E creio que todos devemos e podemos fazer melhor.
Antes de mais, os titulares de cargos públicos, que têm a suprema responsabilidade de representar a nossa comunidade e tomar, por nós todos, as opções que vão determinar o nosso futuro.
Que devem reforçar a cada passo a transparência dos seus atos, a credibilidade do seu exemplo, e a convicção na comunidade de que aquilo que os move é, sempre, o interesse público.
Também a Comunicação Social, que neste tempo de “pós-verdade”, como muitos já se conformam em qualificar, deve reforçar os critérios de rigor, isenção e clareza, para evitar que, por entre o excesso de ruído e de demagogia, as pessoas se percam e se desinteressem da sociedade a que pertencemos todos, sem conseguir separar o trigo do joio.
E também todos nós, cidadãos, podemos fazer muito mais.
Podemos e devemos pedir mais a quem nos governa.
Sem, porém, exigir resultados impossíveis, que só se podem concretizar na demagogia retórica de quem nunca será solução para os anseios das pessoas comuns.
Podemos e devemos interessar-nos assertivamente pelos assuntos da nossa comunidade.
Mas pelos assuntos importantes para o nosso futuro, e não apenas pelos títulos que fazem a espuma dos dias, e rapidamente sucumbem à próxima maré mediática.
E, sobretudo, podemos e devemos participar na política e na vida pública.
Porque quem não participa, nem contribui, e se limita a criticar uma realidade da qual voluntariamente se alheou, ficará sempre sujeito a que sejam outros a decidir o seu futuro.
Minhas senhoras e meus senhores,
Depois de partilhar convosco esta breve reflexão, é imperioso que relembre que estamos em ano eleitoral.
No qual, uma vez mais, a nossa Região será chamada a decidir o que pretende para o futuro, quais as prioridades e quais os protagonistas.
São hoje evidentes para todos os imensos benefícios, a todos os níveis, que a Democracia e a Autonomia trouxeram à nossa terra.
A melhor forma que temos de preservar, garantir e defender essas conquistas é participarmos no processo democrático.
Por isso, apelo a todos os que têm o direito de votar que considerem que também têm o dever de o fazer, pois só assim poderão, com o seu voto, que é no fundo a sua arma, influenciar os destinos da nossa Terra.
Aos cidadãos que se vão candidatar para, através dos partidos políticos e em nome da Comunidade, tomarem as opções que decidirão aquilo que a nossa Região Autónoma será nos próximos anos, desejo que possam, em ambiente de calma e civismo, como sempre tem acontecido, apresentar as suas propostas.
E que, uma vez eleitos, tenham sempre claro o único propósito legítimo do exercício de cargos públicos- a defesa do supremo interesse das populações.
Minhas senhoras e meus senhores,
As comemorações do 10 de junho na Madeira têm incluído dois momentos que considero, cada um à sua dimensão, particularmente significativos.
No passado sábado, nesta sala, tivemos ocasião de ouvir e premiar os quatro primeiros classificados no concurso literário dedicado ao Dia de Portugal.
Trata-se de uma iniciativa que tem sempre contado com a presença e com o apoio do Senhor Secretário Regional da Educação, Ciência e Tecnologia, a quem muito agradeço, e que pretende distinguir trabalhos de alunos das escolas da Região.
É um modesto contributo para motivar os jovens a refletirem sobre o nosso País, a nossa História, a nossa identidade e o nosso futuro, e pretende simbolizar a importância central que têm a Educação e a Cultura na formação dos cidadãos do Portugal do amanhã.
E, como teremos ocasião de concluir da leitura do trabalho classificado em primeiro lugar, a notícia de que os jovens hoje não leem, não escrevem e não se interessam parece, felizmente, largamente exagerada.
O segundo momento é a entrega das condecorações atribuídas por S.Exa. o Presidente da República.
Neste dia 10 de junho, foram condecorados pelo Senhor Presidente da República, sob minha proposta (que só a mim me responsabiliza), duas individualidades e duas instituições, que se destacaram pelos seus feitos e contributos para uma sociedade melhor.
Serão em seguida condecorados:
- O Conservatório - Escola Profissional das Artes da Madeira – Eng. Luiz Peter Clode com o título de Membro Honorário da Ordem da Instrução Pública;
- A Fundação João Pereira, com o título de Membro Honorário da Ordem do Mérito;
- Maria Isabel Câmara Santa Clara Gomes Pestana, com o título de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique;
- Ernesto Estevão Borges Machado, com o título de Oficial da Ordem do Mérito Empresarial – Classe do Mérito Comercial.
Este ano as condecorações destacam, respetivamente;
- O culto da excelência na formação para as artes performativas e o trabalho incessante na educação musical dos jovens.
- O trabalho social continuado e persistente, de origem benemérita, iniciado numa época e numa localidade em que quase não existiam respostas públicas para a terceira idade.
- Uma carreira notável de dedicação às Belas Artes, em todas a suas dimensões.
- A iniciativa empresarial pioneira, que permitiu abrir novos caminhos ao turismo na costa norte da Ilha da Madeira, salvaguardando sempre a autenticidade regional.
Mas mais importante que destacarmos percursos passados, devemos ver nos condecorados uma referência para o futuro.
E olhar para o seu trabalho e dedicação à comunidade como um exemplo que fica para as novas gerações, e para os tempos exigentes que nos aguardam.
Minhas senhoras e meus senhores,
Neste dia em que celebramos o Dia de Portugal, é impossível olhar para o passado sem sentir orgulho no caminho que fizemos.
E, daí, olhar o futuro com otimismo.
Certos que, unidos, vamos navegar com sucesso todos os mares, e afrontar, com coragem, Bojadores e Adamastores que os tempos nos trouxerem.
Cumprindo o verso d’ Os Lusíadas com que termino:
“E, vós, ó bem-nascida segurança / Da Lusitana antiga liberdade, / E não menos certíssima esperança.”
Viva a Região Autónoma da Madeira!
Viva Portugal!