DISCURSO PROFERIDO PELO REPRESENTANTE DA REPÚBLICA PARA A REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA NA SESSÃO SOLENE DO DIA DO CONCELHO DE MACHICO, NO DIA 9 DE OUTUBRO DE 2016
É sempre com grande alegria que aqui venho nesta data, em que todos os votos invocam o Senhor dos Milagres e o Vale de Machico volta a ser o centro da Ilha.
Esta cidade de Machico foi terra primeira da descoberta da Madeira, “Vila Idosa” como lhe chamava já Francisco Álvares de Nóbrega, local de beleza excepcional, habitada por gente rebelde e orgulhosa, e onde a força da natureza se impõe, tantas vezes, ao destino dos homens.
Beleza excepcional e variada que podemos contemplar em Machico e por todo o Concelho, desde o alto do Pico do Facho à dureza agreste da Penha D’Águia, das encostas panorâmicas do Campo de Golf à amenidade da Prainha, da vertigem da Boca do Risco ao mar azul da Baia D’Abra.
Gente orgulhosa da sua identidade, antiga como o tempo das Capitanias, que levou sempre os machiquenses a contestarem todas as dependências e centralismos, e a afirmarem as suas próprias opções ao longo da História, durante a ditadura, no papel que desempenhou na Revoltas de 1931 e 1936, e mesmo no actual regime democrático.
E, desde sempre, a presença de uma natureza caprichosa, que tanto desce em aluviões medonhos do alto do Vale, como, em vagas de marés furiosas, estremece a normal serenidade da Baia e leva consigo barcos e homens.
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Celebra-se neste Dia do Concelho a Festa do Senhor dos Milagres.
Numa devoção luminosa, à luz dos fachos, a noite de ontem levou à Capela dos Milagres centenas e centenas de madeirenses, ansiosos por pagarem as suas promessas e agradecerem as graças recebidas durante o ano.
Seguramente uma das mais impressionantes expressões de Fé na nossa Ilha, a procissão do Senhor dos Milagres significa sobretudo o respeito dos machiquenses pelo seu passado, e a sua confiança num amanhã melhor, para as suas famílias e para a sua Comunidade.
E têm razão para confiar.
Machico é hoje um concelho moderno e com todas as condições para um futuro auspicioso.
Com o seu imenso potencial turístico, servido por uma crescente oferta hoteleira, lúdica e gastronómica.
Com infra-estruturas de qualidade, desde as acessibilidades viárias aos equipamentos públicos, passando pelas instalações portuárias e náuticas e pelos arranjos urbanísticos nos diversos passeios marítimos.
Com estabelecimentos de ensino com resultados de excelência, demonstrados por vários dos seus jovens em competições regionais e nacionais.
Com as suas profundas tradições populares e de criação artística, hoje servidas por equipamentos culturais exemplares, dos quais a Casa do Ribeirinho, onde nos encontramos, é um exemplo evidente.
Com a sua arreigada tradição desportiva e de formação de jovens, que soube evoluir no tempo e transformar o Concelho de Machico num dos centros dos desportos de natureza na Madeira.
Com um calendário de eventos populares, religiosos e desportivos com grande tradição e qualidade, culminando nessa realização singular que é o Mercado Quinhentista.
Por tudo isto, tem o concelho de Machico, e todos os seus habitantes, amplas razões para, neste seu Dia, olhar o futuro com confiança e alegria.
Minhas Senhoras e meus Senhores,
É importante, no entanto, não esquecer nem omitir que o Concelho, a Região e o País passam hoje por novas e preocupantes dificuldades.
Porque o Mundo, a Economia e a nossa Civilização ocidental estão em mudança.
Como refere José Tolentino Mendonça, porventura um dos maiores poetas e pensadores portugueses contemporâneos, ilustre filho de Machico, "as nossas sociedades ocidentais estão a viver uma silenciosa mudança de paradigma: o excesso (de emoções, de informação, de expectativas, de solicitações...) está a atropelar a pessoa humana e a empurrá-la para um estado de fadiga, de onde é cada vez mais difícil retornar."
E as dificuldades são também visíveis em Machico.
A um desemprego elevado, que atinge verticalmente todos os estratos da sociedade e todas as qualificações, somam-se as fragilidades e constrangimentos das atividades económicas tradicionais - como a pesca, a agricultura e a construção civil -, sem que a indústria turística e a Zona Franca industrial consigam ser ainda alternativas suficientes.
Sobretudo, muitas famílias não conseguem ter hoje na nossa terra uma vida satisfatória, em que possam aceder às condições de bem-estar que pretendem e merecem, e onde possam ver crescer os seus filhos com confiança no futuro.
Assim, o enorme desafio que se coloca a todos os poderes públicos nos próximos anos não é apenas sair da crise e melhorar os indicadores económicos.
É acima de tudo garantir que o futuro traga não só o crescimento da riqueza, mas a salvaguarda da coesão social e de uma vida digna para todos, como tantas vezes não aconteceu no passado, mesmo em períodos de prosperidade.
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Para responderem aos desafios do tempo presente, permitam que o diga, são os poderes públicos eleitos pelas populações - a nível local, regional e nacional - os primeiros a serem convocados.
E, para tanto, não basta constatar-se que há entre os vários órgãos eleitos normais relações institucionais e um respeito mínimo pelas saudáveis diferenças ideológicas.
Porque, passados 42 anos da instauração da democracia em Portugal, esse é um pressuposto que deveria estar há muito garantido.
É sim necessário um esforço, activo e concertado entre todos, para eleger prioridades, definir estratégias e gerir recursos públicos.
De debate de ideias e de apelo à participação cívica, que permita podermos encontrar as melhores soluções para a Comunidade com os meios que temos.
Sendo hoje claro que, entre as principais correntes politicas, existe ampla concordância sobre os elementos estruturantes do nosso regime constitucional – a opção democrática, a integração europeia, os direitos fundamentais, a construção do Estado Social numa economia de mercado, a importância da Autonomia e do poder local – o tempo e as circunstâncias exigem cada vez mais que se evitem antagonismos estéreis, tantas vezes artificiais, em nome de um esforço para obter consenso nas verdadeiras prioridades.
E, em relação a esta Região Autónoma, um dos possíveis desígnios comuns parece-me claro, para autarquias, órgãos autonómicos e órgãos de soberania: trabalhar para que possa ser plenamente assegurado na Madeira e Porto Santo, e em todos os concelhos, o princípio da continuidade territorial.
E conseguir que, como manda a Constituição, os madeirenses não continuem a ver diminuídos e limitados os seus direitos pelo facto de viverem numa ilha.
É, pois, tempo de consensos; para os obter os políticos, todos nós, como lembrou o Senhor Presidente da República, devem dar exemplo de humildade, proximidade, frugalidade, independência e serviço dos outros e estar próximos de quem os elegeu.
E é para esse esforço, em nome do interesse maior de Machico, que desde já lhe desejo, senhor Presidente, as maiores felicidades, e lhe reafirmo que pode sempre contar com a minha total colaboração.
Permitam-me que termine, fazendo um brinde ao futuro, voltando a lembrar Francisco Álvares de Nóbrega: "Segue a bonança à tempestade feia / Virá um tempo, em que eu também possa / quebrada ver esta fatal cadeia”.
Desejo-vos a todos as maiores felicitações neste Dia do Concelho.
Viva Machico.
Viva a Região Autónoma da Madeira.
Viva Portugal.