499.º aniversário do Municipio de Santa Cruz

DISCURSO PROFERIDO PELO REPRESENTANTE DA REPÚBLICA PARA A REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA NA SESSÃO SOLENE COMEMORATIVA DO 499º ANIVERSÁRIO DO DIA DO CONCELHO DE SANTA CRUZ, NO DIA 25 DE JUNHO DE 2014

Saúdo e felicito calorosamente Santa Cruz no dia do seu concelho, prelúdio do marco histórico dos 500 anos que se aproximam.

É com muito gosto que me encontro entre vós acedendo ao amável convite que o Senhor Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz me quis dirigir.

Conheço bem esta terra: Santa Cruz é um município de marcadas tradições, onde convivem diariamente realidades diversas, do ponto de vista económico, profissional, social e cultural.

Muitos dos que aqui residem representam um elo de sucessivas gerações que nunca abandonaram Santa Cruz.

Outros vieram em busca da qualidade de vida e da atratividade que sabe proporcionar, não sendo por isso de estranhar que seja um dos Concelhos com maior crescimento populacional a nível nacional.

E, se não passou imune às recentes adversidades naturais, a elas tem sabido reagir com notável energia e determinação.

            Minhas Senhoras e meus Senhores:

Aqui em Santa Cruz, a convivência de tradições ancestrais com a modernidade permite invocar a dimensão histórica das instituições municipais de que falava Alexandre Herculano, cito: “O país não é senão a soma das suas localidades”.

Um país que é a soma das diferentes parcelas do seu território.

Um país que se quer descentralizado, sabendo que esta palavra é também sinónimo de municipalismo.

Podemos, por isso e com propriedade, repetir novamente Alexandre Herculano quando dizia: “Queremos que a vida local seja uma realidade, para que o governo central possa representar o pensamento do país”.

É certo que a realidade é hoje bem mais complexa do que no século XIX, em que viveu o Historiador romântico. 

Mas nem assim a ideia, então presente, de robustecer o poder local perdeu sentido.

Esta encontra-se ancorada, ainda hoje, na nossa Constituição e, bem-assim, nos Tratados Europeus e na Carta Europeia da autonomia local.

Com efeito, o poder local, democraticamente legitimado, representativo e apoiado no princípio da democracia económico-social, é uma das principais conquistas de Abril.

Assim, ao incluir a democracia local entre as opções constitucionais fundamentais, a nossa Constituição deu um contributo essencial para colocar Portugal na vanguarda das democracias ocidentais.

Não há, no Mundo, nenhum Estado realmente desenvolvido - sustentavelmente desenvolvido, permito-me afirmar - que não conheça um nível alto de descentralização político-administrativa. 

Neste sentido, são actuais as palavras de Herculano.

É na proximidade do poder local e da sua representatividade que começa a identificação política da comunidade.

Em certo sentido, portanto, aquilo que hoje é por vezes designado como “romantismo municipal” é, no fundo, uma opção pragmática que decorre, justamente, do princípio da subsidiariedade consagrado logo nos artigos iniciais da nossa Constituição.

Na verdade, as autarquias locais são o ponto de contacto mais próximo dos cidadãos com a democracia.

E constituem também a primeira linha das instituições democráticas que procuram, de forma conjunta, ir ao encontro dos anseios coletivos.

Esta ideia de proximidade com as populações é ainda mais sentida nas Regiões Autónomas.

Paralelamente com o poder local, o poder regional representa outra significativa conquista alcançada com a Constituição de 1976 – erguendo-se também a partir do princípio da subsidiariedade - que muito contribuiu para o desenvolvimento do nosso arquipélago.

Estes dois poderes – regional e local – são, por conseguinte, indissociáveis, porque ambos contribuem decisivamente para o notável desenvolvimento que a nossa Região alcançou desde 1976.

É portanto imprescindível que prossigam o caminho conjunto para o benefício e bem‑estar de todos, pois só no diálogo entre a administração local e a administração regional poderemos vencer as nossas dificuldades.

São dificuldades que acompanho de perto, como é meu dever, nomeadamente o drama que o desemprego representa na vida de uma parte significativa dos nossos conterrâneos.

Reconheço a ação deste município, como dos outros em geral, no apoio às pessoas necessitadas, tirando partido do conhecimento direto destas situações, promovendo a inclusão e a integração social.

Mas, tenho como certo que muitos dos nossos problemas, pela sua transversalidade, não poderão ser ultrapassados de forma adequada numa perspetiva estrita do espaço municipal.

Apelo a um esforço solidário, pois cada comunidade ou concelho não pode desenvolver-se fora do contexto da região em que se integra.

Só o recurso a formas de associação e cooperação institucional permitirá, na sua complementaridade, a produção de sinergias potenciadoras de uma gestão eficaz e eficiente dos recursos existentes e assim obter os melhores resultados de desenvolvimento local e regional.

Espero que a articulação e conjugação do poder regional com o poder local – ainda que no contexto da diversidade democrática que daí possa resultar – permitam alcançar consensos que a todos beneficiem, motivando e justificando aproximações em prol dos santa-cruzenses e dos madeirenses em geral.

Pela minha parte, estarei sempre ao dispor de todos para ajudar a incrementar a autonomia regional, para a qual a relação solidária entre poder regional e poder autárquico é condição essencial.

A coesão nacional é também coesão entre todos os poderes, da República, das Regiões e locais, visando um só objetivo comum: o bem-estar das populações.

          Minhas Senhoras e meus Senhores:

Se o desenvolvimento não é, nem pode ser, da exclusiva responsabilidade do poder central, tão-pouco há verdadeira descentralização político-administrativa sem descentralização económico-financeira.

O poder regional e autárquico não poderão desempenhar o seu papel na democracia se não forem dotados de recursos que lhes permitam cumprir as atribuições e competências conferidas pela Constituição e pela lei.

Estou atento a esta questão à qual o Município de Santa Cruz, sei, não está imune.

Acompanho a realidade do poder local na Região Autónoma da Madeira e conheço as necessidades, tanto dos concelhos onde há mais graves níveis de desigualdade, como daqueles que têm os olhos já postos em horizontes mais ambiciosos.

Mas todos conhecem problemas comuns, por exemplo, ao nível dos transportes.

Santa Cruz é, aliás, um Concelho simbólico a este respeito, porque definitivamente associado ao tráfego aéreo.

Por isso, dificilmente haveria local mais apropriado para insistir na adequação dos preços das ligações aéreas ao continente e entre ilhas, reafirmando-se, dessa forma, o princípio da continuidade territorial.

Observo, por exemplo, o que é exigido aos nossos estudantes ou aos acompanhantes de pessoas doentes nas deslocações ao Continente e verifico que a situação actual não pode manter-se.

Não se trata de uma ideia nova, nem própria de certa visão ou força política: é um desígnio regional e nacional no qual tenho, por diversas vezes, insistido.

Como disse – e repito – não podemos esquecer os mais fracos sobretudo neste tempo de crise.

Recordo, aliás, que já Aristóteles dizia, numa frase com notável atualidade: a política é a arte da realização da justiça.

Façamos por cumpri-la!

            Minhas Senhoras e meus Senhores:

Quero deixar um voto de confiança, de estímulo e de apreço a todos os santa-cruzenses.

Sempre que venho a esta terra sinto o calor e hospitalidade das suas gentes.

Permitam-me, pois, que retribua, fazendo destas palavras uma forte e sentida homenagem a Santa Cruz, que muito admiro, neste dia especial.

Muito obrigado a todos!